A PRESENÇA EVANGELIZADORA DA IGREJA
A Igreja e sua presença evangelizadora na cidade
Pe. Nelito Dornelas
No objetivo geral das Diretrizes Gerais de Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil se reconhece que a missão da Igreja é evangelizar “no Brasil cada vez mais urbano”. Diante desta constatação, torna-se necessário uma análise mais apurada deste mundo urbano com seus desafios à evangelização.
Sabemos que as cidades foram construídas, ao longo da história, como um processo de reconstrução coletiva dos grupos humanos, em busca de segurança, proteção e garantia de vida para o clã. Com o advento da modernidade este processo de urbanização tornou-se a grande realização da humanidade. Nas cidades modernas, mesmo conservando os laços parentais, o indivíduo emancipou-se, pois libertou-se da tutela e dos mecanismos de controle social como a família, a comunidade, o clã e a religião.
O Século XX representou o momento culminante desta grande migração do campo para a cidade. Os últimos milhões de camponeses que ainda restam preparam-se para migrar para as cidades médias, pequenas ou grandes em todo o mundo. Dado a esta nova situação, as cidades tornaram-se o cruzamento de todas as questões humanas, culturais, espirituais, econômicas, políticas e sociais.
A cidade, a polis, a civitá é onde se constrói artesanalmente a cidadania e onde se exercita com maior eficiência a vida política. Porém a cidade acabou provocando a ruptura entre a política e a ética, a economia e a ética, a técnica ou a ciência e a ética. Cada dimensão da vida social tornou-se autônoma, criando em si mesma seus objetivos: a política busca conquistar o poder; a economia se submete exclusivamente ao lucro e a técnica ou a ciência estão a serviço da eficiência. Poder, lucro e eficiência, na linguagem religiosa, são os três princípios idolátricos contra os quais Jesus lutou desde sua experiência de tentação no deserto, após o batismo, até seu martírio final no calvário.
Em consequência da escolha deste modelo de sociedade, os pobres que foram para construir a cidade e sua liberdade acabaram caindo numa armadilha: fora quebrada sua cosmovisão e seus laços sociais, passando a experimentar os nós existenciais mais dramáticos sem ter com quem compartilhar e as duras realidades sócio econômica. O pobre citadino moderno tornou-se um ser em constante migração, desterritorializado, telemático e inseguro.
Considerável porção das igrejas, representantes do universo simbólico e guardiãs da ética, foi assaltada e sequestrada de roldão pelo canto da sereia do consumismo, abrindo mão do princípio da salvação pela praticidade da solução, do humanitário pelo monetário, da sobriedade pela prosperidade.
O mercado assumiu o lugar da religião permitindo o paraíso as pessoas competentes que se tornarem consumidores. Os pobres, ao invés de se tornarem cidadãos, foram excluídos e, muitas vezes, sentem-se culpados por não controlarem uma realidade que a cada dia lhes escapa por entre os dedos. Restam-lhes a única opção de lidarem com o sagrado aos moldes concebidos no universo rural primitivo, desvinculando-se das instituições eclesiásticas, dando vasão ao corpo humilhado e à alma abatida.
Diante do “Brasil cada vez mais urbano” somos desafiados a responder a algumas questões, para que, honestamente, possamos assumir nossa ação evangelizadora.
É possível anunciar a Boa Nova de Jesus Cristo aos que estão mergulhados na cultura urbana e aos habitantes das cidades?
Qual é esta Boa Nova que hoje se espera?
Para quem ela se dirige e quais resultados ela deve proporcionar?
-O que esta Boa Nova deve propor?
Quais os meios que temos à nossa disposição para oferecê-la e para comunicá-la?
Onde está a eficácia da Boa Nova, nos meios ou em si mesma? E qual é sua eficácia?
A cidade, considerando seus habitantes, precisa realmente desta Boa Nova?
Tem espaço para as instituições eclesiásticas nas cidades? Qual e para quê?
Os ministros ordenados ainda são necessários no mundo urbano?
Qual a maior provocação espiritual que a cidade apresenta às igrejas cristãs?
Ainda permanece válido o princípio agostiniano: no essencial, a unidade; no duvidoso, liberdade; mas acima de tudo a caridade.