EUCARISTIA

 

EUCARISTIA


Eucaristia, lugar da manifestação plena do amor de Deus

Pe. Nelito Dornelas

 

A Eucaristia é o sacramento da Aliança selada entre Deus e a humanidade. Em cada Eucaristia celebrada, renova-se esta aliança, tornando a comunidade eclesial fonte fecunda de vida divina que se transborda para a criação divina. 

O amor esponsal vivenciado na Eucaristia é um amor que tem o seu ponto culminante na cruz, expressão das núpcias de Jesus com a humanidade, assumindo-a plenamente a partir de suas mais violentas derrotas, transformando-as e redimindo-as. 

Ao exprimir a irreversibilidade do amor de Cristo pela humanidade, compreende-se que tanto na Eucaristia quanto na Igreja estão presentes aquela indissolubilidade a que todo amor verdadeiro é chamado a expressar.

Há, portanto, uma íntima ligação entre a vida de oração (lex orandi) e a vida de fé (lex credendi). A relação entre o mistério acreditado e o mistério celebrado manifesta-se, de modo peculiar, no valor teológico e litúrgico da adoração. 

Ninguém pode comer dessa carne e beber desse sangue, sem antes os adorar. Adorar é o maior gesto de amor. Quem se ajoelha diante do Santíssimo, somente o poderá fazer para expressar seu infinito amor por Jesus, pois Ele mesmo nos advertiu de que não quer ser seguido e adorado, mas amado. Adorá-lo ou segui-lo sem amá-lo é cometer uma heresia, pois seria transformá-lo em um ídolo. Não se pode adorar a um ídolo, mas somente a Deus. 

Não os chamo de servos e servas ou escravos e escravas, mas de amigos e amigas, pois tudo o que conheci do coração do meu Pai vos dei a conhecer. O servo não sabe o que pensa o seu senhor (cf João 14).

Portanto, a adoração é o prolongamento visível da celebração eucarística, a qual, em si mesma, é o maior ato de expressão de fé da Igreja. Alimentar-se da Eucaristia significa colocar-se em atitude de adoração diante d'Aquele que comungamos. Precisamente assim, e apenas assim, é que nos tornamos um só com Ele e, de algum modo, saboreamos antecipadamente a beleza da liturgia celeste, manifestando-lhe nosso amor. 

O ato de adoração fora da celebração eucarística  prolonga e intensifica o que se faz na própria celebração eucarística, portanto, é uma ação litúrgica e uma celebração do amor.

 

Fazei isso em memória

Memória é uma palavra tão antiga como aquelas árvores enormes, de troncos robustos, copas acolhedoras, raízes tão profundas, que parecem chegar até o ventre da terra, misturando-se com outras terras, outros povos, outras línguas e culturas.  Na sua raiz, que vem desde o ventre da humanidade, desde o começo da língua falada por muitos povos, memória tem a ver como o corpo, com a mente, com ventre, luas e, sobretudo, memória tem a ver com a palavra desejo.

Fazer memória é recordar, fazer voltar ao cordis, coração. Recordar coisas do coração que fazem o nosso corpo sentir-se vivo no desejo para a vida. Memória tem a ver com a saudade das coisas passadas que, voltando ao coração, reavivam o desejo e trazem dentro o cheiro da vida futura.

Como testifica Rubem Alves (1997): Memória é saudade e arrepio pelo que ainda vai acontecer. E saudade é amor ausente presente simbolicamente. Memória, saudade e desejo têm a ver com perfume. Um perfume traz de volta a pessoa amada. Um perfume nos faz voltar às terras que nos viram nascer, aos campos grávidos de colheitas, às muitas cores do céu, ao mar com suas cantigas de ninar, à cozinha da casa da nossa infância, ao colo protetor da mãe, ao abraço e beijo do primeiro amor.

Um perfume nos une ao passado e nos faz sonhar. Um perfume penetra suavemente na nossa pele e engravida os nossos sentidos. Um perfume nos faz ternos e eternos. Ela quebrou o vaso, e derramou o perfume na cabeça de Jesus (Mc 14,3b).

E Jesus sentencia solenemente:  Eu garanta a vocês; por toda parte, onde esta Boa Notícia for pregada, também contarão o que ela fez, e ela será lembrada (Mt 26,13).

 

Adorar: uma forma de fazer memória do amor contagiante

 

Recordo-me das palavras de Santo Agostinho: O corpo eucarístico de Cristo é a Igreja inteira, isto é, a totalidade dos fiéis.

De fato, do alto do Calvário quando Jesus de Nazaré entrega seu espírito ao Pai, quebra-se o frasco de alabastro do oriente e exala-se o perfume mais contagiante, capaz de despertar em toda humanidade a memória adormecida e fazer de cada pessoa que se aproxima deste mistério um ser eucarístico.

Não é sem razão que já no século III a Didaskalia compilou este enunciado: O altar de Deus são as viúvas e os órfãos. E mais: Os bispos devem olhar com grande cuidado e escrupulosidade, quem são os que trazem ao altar, na celebração eucarística, as esmolas para os pobres da comunidade. E em seguida apresenta uma vasta lista de pessoas das quais não se pode receber a oferta, pois mosca morta estraga um vidro de perfume, e um pouco de insensatez pesa mais do que a sabedoria e a honra (Ecl 10,1).

Para os primeiros cristãos a Eucaristia não precisava ser explicada, mas uma experiência comunitária a ser vivida. E mais: quando há divisões entre os cristãos, a eucaristia não é aceita por Deus. 

De fato, diante de Deus nós somos o bom perfume de Cristo entre aqueles que se salvam e entre aqueles que se perdem: para uns, perfume de morte para a morte; para outros, perfume de vida para a vida. E quem estaria à altura de tal missão? (2 Cor 2, 15-16).

A Igreja é a nova família de Jesus, chamada a espalhar no mundo o bom perfume do evangelho. Adorar é mergulhar neste mistério de fé preanunciado na carta aos Gálatas: Portanto, enquanto temos tempo, pratiquemos o bem para com todos, mas principalmente para com os irmãos na fé (6,10).

 

Fazei isso em memória

Pe. Nelito Dornelas

Memória é uma palavra tão antiga como aquelas árvores enormes, de troncos robustos, copas acolhedoras, raízes tão profundas, que parecem chegar até o ventre da terra, misturando-se com outras terras, outros povos, outras línguas e culturas.  Na sua raiz, que vem desde o ventre da humanidade, desde o começo da língua falada por muitos povos, memória tem a ver com corpo, com mente, com ventre, luas e, sobretudo, com a palavra desejo.

Fazer memória é recordar, fazer voltar ao cordis, coração. Recordar coisas do coração que fazem o nosso corpo sentir-se vivo no desejo para a vida. Memória tem a ver com a saudade das coisas passadas que, voltando ao coração, reavivam o desejo e trazem dentro o cheiro da vida futura.

Como testifica Rubem Alves (1997): Memória é saudade e arrepio pelo que ainda vai acontecer. E saudade é amor ausente presente simbolicamente. Memória, saudade e desejo têm a ver com perfume. Um perfume traz de volta a pessoa amada. Um perfume nos faz voltar às terras que nos viram nascer, aos campos grávidos de colheitas, às muitas cores do céu, ao mar com suas cantigas de ninar, à cozinha da casa da nossa infância, ao colo protetor da mãe, ao abraço e beijo do primeiro amor.

Um perfume nos une ao passado e nos faz sonhar. Um perfume penetra suavemente na nossa pele e engravida os nossos sentidos. Um perfume nos faz ternos e eternos. Ela quebrou o vaso, e derramou o perfume na cabeça de Jesus (Mc 14,3b). E Jesus sentencia solenemente:  Eu garanto a vocês; por toda parte, onde esta Boa Notícia for pregada, também contarão o que ela fez, e ela será lembrada (Mt 26,13).

É em memória de Jesus que celebramos a Eucaristia, o sacramento da Aliança selada entre Deus e a humanidade. Em cada Eucaristia celebrada, renova-se esta aliança, tornando a comunidade eclesial fonte fecunda de vida divina que se transborda para a criação divina, fazendo-nos bons perfumes de Cristo, como afirma o Apóstolo Paulo em 2 Coríntios 2,15.

Ser o bom perfume de Cristo é espalhar a fragrância do Evangelho em todos os ambientes de nossa vida a começar pelo nosso lar, passando pelo ambiente de convivência profissional, social e eclesial.  Esta fragrância é o amor esponsal vivenciado na Eucaristia, é um amor que tem o seu ponto culminante na cruz, expressão das núpcias de Jesus com a humanidade, assumindo-a plenamente a partir de suas mais violentas derrotas, transformando-as e redimindo-as, a partir da fé. É neste sentido que somos exortados pelo Apóstolo Paulo a nos oferecermos em sacrifício, que seja agradável a Deus, como hóstias vivas na patena do mundo: Exorto-vos, portanto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus: este é o vosso culto espiritual (Romanos 12, 1).

A todos nós que estamos recolhidos neste tempo de pandemia do coronavirus e impedidos de participar da celebração eucarística em comunidade eclesial, somos incentivados e provocados a voltar a estas fontes de nossa espiritualidade vividas pelas primeiras comunidades cristãs e celebrarmos em nossas casas a Eucaristia espiritual fazendo-nos hóstias vivas. A proposto faz muito bem recordar que a celebração eucarística nos convoca a experimentarmos, no mínimo, sete comunhões fundamentais.

Primeira comunhão é com a Santíssima Trindade, mergulhando-nos neste mistério de Deus Pai, fonte de toda fecundidade, de Deus Filho, princípio da fidelidade e de Deus Espírito Santo, sustentáculo da indissolubilidade desta comunhão sempre atual.

Segunda comunhão com a Palavra de Deus, este livrinho a ser comido e devorado, cujo sabor é doce como mel em nosso paladar, mas que no estômago, muitas vezes, amarga como fel (cf Apocalipse 10, 8-9). 

Terceira comunhão com a criação divina, ao bendizer a Deus pelo pão e pelo vinho frutos da terra, do trabalho humano e que se transformam em vida e salvação.

Quarta comunhão com os pastores legitimamente constituídos, sinais de unidade na diversidade da Igreja que se faz presente pelo mundo inteiro.

Quinta comunhão com os santos e santas que caminharam pelas estradas da vida com suas lâmpadas acesas e nos antecederam na plenitude da vida eterna.

Sexta comunhão com os mortos, os mártires, patriarcas e matriarcas de nossa fé e todas as testemunhas do Reino de Deus.

Sétima comunhão com Jesus Cristo, recordando sempre de suas sagradas palavras na última ceia: tudo os que vocês fizerem, façam em minha memória.

Assim afirma Santo Agostinho: O corpo eucarístico de Cristo é a Igreja inteira, isto é, a totalidade dos fiéis. De fato, do alto do Calvário quando Jesus de Nazaré entrega seu espírito ao Pai, quebra-se o frasco de alabastro do oriente e exala-se o perfume mais contagiante, capaz de despertar em toda humanidade a memória adormecida e fazer de cada pessoa que se aproxima deste mistério um ser eucarístico. Não é sem razão que já no século III a Didaskalia compilou este enunciado: O altar de Deus são as viúvas e os órfãos. 

 

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