FÉ E MISSÃO
A vivência da fé e o compromisso com a missão
Pe. Nelito Dornelas
Estamos no mês missionário extraordinário proclamado pelo Papa Francisco, para celebramos os 100 anos da Carta Apostólica Maximum Ilud de Bento XV.
Neste documento o pontífice convida toda a Igreja a traduzir a profissão de fé apostólica, num dinamismo missionário. Este convite foi dirigido a todos os batizados, para que traduzissem sua experiência pessoal com Jesus Cristo em seguimento a Jesus, como um fruto amadurecido dessa experiência (cf. At 2,36; Jo 20,30-31; Fil 2,11; Rm 10,9; 1Cor 12,3; Cl 2,6; Ap 5,9; 12,5;19,16).Daí a importância de voltarmos às primeiras comunidades cristãs, para percebermos como elas partem da vida e da prática do Jesus histórico (Mc 6,1-6), aprofundam o sentido da pessoa de Jesus, dando-lhe os diferentes títulos expressos nas profissões de fé e, a partir da prática de Jesus, caminham na direção do Deus Trindade, comunhão de pessoas iguais e diferentes.
Há um poema de Rubem Alves que nos ajuda na busca existencial do Jesus Histórico. Assim ele se expressa:
No silêncio da noite a criancinha chora – Acho que está com fome – diz a mãe. E ela toma o próprio corpo, o seu seio, e o oferece àquele corpinho que nada conhece deste mundo, a não ser a fome. A boca, obediente à fome e à vida, suga o sangue branco, leite... Assim, do corpo de uma mulher se alimenta o Deus-menino... Deus com fome, Deus que morre se o corpo humano não lhe for oferecido como comida.
Primeira eucaristia, invertida, eucaristia de Natal: recebemos no colo o Deus faminto e lhe dizemos: aqui está o meu corpo, aqui está o meu sangue. Leite materno. Vida de todas as crianças. Suga. Bebe. Mata a tua fome. Vive.
Deus que é fome, eternamente humano, encarnado, à espera do alimento. Deus nos toma como seu sacramento. Deus se fez homem. Comeu o nosso corpo, bebeu o nosso sangue...
A ação missionária se dá pelo testemunho da encarnação. Jesus se faz carne e sangue em nós. Somos também a continuidade da encarnação do Verbo nas asperezas da vida e nas fendas da história. Somos impelidos a expressar a imagem de Jesus, mesmo guardando seu mistério, vivendo em conformidade com a mensagem do Evangelho.
A missão não esgota, mas mantem sempre atual toda a profundidade e fecundidade do mistério, como nos indica o Concílio Vaticano II na Dei Verbum,4:
Jesus Cristo, portanto, Verbo feito carne, enviado como homem aos homens, profere as palavras de Deus (Jo 3,24) e consuma a obra salvífica, que o Pai lhe confiou (cf.Jo 5,36; 17,4). Eis porque Ele, ao qual quem o vê, vê também o Pai (cf. Jo 14,9), pela total presença e manifestação de si mesmo por palavras e obras, sinais e milagres, e especialmente, por sua morte e gloriosa ressurreição dentre os mortos e, enfim, pelo Espírito de verdade enviado, realiza e completa a revelação e a confirma, atestando de maneira divina que Deus está conosco para libertar-nos das trevas e do pecado e para ressuscitar-nos para a vida eterna.
D. Pedro Casaldáliga, o grande místico do Araguaia, assim retrata o mistério da encarnação, expressando a tensão sempre presente na vivência do cristianismo entre a divindade e a humanidade de Jesus: No ventre de Maria, Deus se fez homem. Mas na oficina de José, Deus também se fez classe. O Verbo se fez carne. O Verbo se fez pobre. O Verbo se faz índio... Planta entre nós a sua maloca.
As imagens de Jesus tentam traduzir, em linguagem plástica ou poética, o grande mistério da encarnação, principio e fim da missão.