SPE SALVI - ESPERANÇA DA SALVAÇÃO
Uma leitura da encíclica Spe Salvi, a Esperança da Salvação
Pe. Nelito Dornelas
O Papa Bento XVI escreveu a encíclica Spe Salvi (Somos salvos na esperança), na qual apresenta as características essenciais da esperança oferecida por Cristo, sobretudo, considerando o declínio da esperança na humanidade atual.
O texto começa com uma passagem da carta do Apóstolo Paulo aos romanos, é na esperança que fomos salvos (8, 24), e destaca como elemento distintivo da vida cristã a fé na ressurreição. Ele acredita, como São Paulo, que a vida cristã consiste fundamentalmente em vivermos como ressuscitados, antecipadamente à nossa morte biológica. E afirma que chegar a conhecer Deus, o verdadeiro Deus: isto significa receber esperança.
Ele afirma que Jesus não trouxe uma mensagem sócio revolucionária, não era um combatente por uma libertação política. Trouxe o encontro com o Deus vivo, com uma esperança que era mais forte do que os sofrimentos da escravidão, e, por isso mesmo, transformava as pessoas e a sociedade a partir de dentro (4). A esperança é apresentada não como algo, mas como Alguém, uma pessoa: não se fundamenta no que passa, mas em Deus, que se entrega para sempre (8). E acrescenta, a crise atual da fé é, sobretudo, uma crise da esperança cristã (17).
As desilusões vividas pela humanidade nos últimos tempos fundam-se no canto da sereia dos sistemas políticos, tanto à direita quanto à esquerda, que prometeram realizar o paraíso na terra: o capitalismo pelo consumismo sem limites, explorando a dimensão do desejo e não satisfazendo as necessidades reais das pessoas e, os diversos socialismos, pela planificação da economia. Ambos se esqueceram que a liberdade do ser humano permanece sempre liberdade, inclusive para o mal (21). De fato, o ser humano não se realiza apenas pela satisfação dos seus desejos e, tão pouco, pela concretização de suas necessidades. Há algo ainda sempre maior e indescritível em cada criatura. O ser humano não é só um ser movido por desejos e produto de condições económicas nem se pode curá-lo apenas do exterior criando condições económicas favoráveis (21).
A fé cega no progresso é outra das desilusões analisadas, acreditando segundo o qual a humanidade poderá ser redimida pela ciência. A ciência pode contribuir muito para a humanização do mundo e dos povos. Mas, pode também destruir o ser humano e o mundo, se não for orientada por forças que se encontram fora dela. Não é a ciência a que redime a humanidade. A humanidade é redimida pelo amor. (25-26)
São indicados quatro lugares de aprendizagem e de exercício da esperança cristã:
1- A oração: Quando já ninguém me escuta, Deus ainda me ouve. Quando já não posso falar com ninguém, nem invocar mais ninguém, a Deus sempre posso falar (32).
2- O agir. A esperança, em sentido cristão, é sempre esperança para os demais. Só a grande esperança-certeza de que, não obstante todos os fracassos, a minha vida pessoal e a história no seu conjunto estão conservadas no poder indestrutível do Amor e, graças a isso e por isso, possuem sentido e importância, só uma tal esperança pode, naquele caso, dar ainda a coragem de agir e de continuar (35).
3- O sofrimento. Certamente é preciso fazer todo o possível para diminuir o sofrimento; contudo, não é evitar o sofrimento, a fuga diante da dor, que cura o ser humano, mas a capacidade de aceitar a tribulação e nela amadurecer-se, de encontrar o seu sentido através da união com Cristo, que sofreu com infinito amor (37).
4- O Juízo de Deus. Sim, existe a ressurreição da carne. Existe uma justiça. Por isso, a fé no Juízo final é, primariamente, e, sobretudo, esperança – aquela esperança, cuja necessidade se tornou evidente justamente nas convulsões dos últimos séculos (43). Mas a esperança não é egoísta. Ninguém vive só. Ninguém peca sozinho. Ninguém se salva sozinho. Continuamente entra na minha existência a vida dos outros: naquilo que penso, digo, faço e realizo. E, vice-versa, a minha vida entra na dos outros: tanto para o mal como para o bem (48). O que posso fazer a fim de que os outros sejam salvos e nasça também para eles a estrela da esperança? Então terei feito também o máximo pela minha salvação pessoal (48).
A encíclica conclui apresentando Maria, estrela da esperança. Mãe nossa, ensinai-nos a crer, esperar e amar convosco. Indicai-nos o caminho para o seu reino! Estrela do mar, brilhai sobre nós e guiai-nos no nosso caminho (50).